LEI Nº 9.263, DE 12 DE JANEIRO DE 1996

 
 

Regula o § 7º do art. 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar, estabelece penalidades e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:


CAPÍTULO I
DO PLANEJAMENTO FAMILIAR



Art. 1º - O planejamento familiar é direito de todo cidadão, observado o disposto nesta Lei.


Art. 2º - Para fins desta Lei, entende-se planejamento familiar como o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal.

Parágrafo único - É proibida a utilização das ações a que se refere o caput
para qualquer tipo de controle demográfico.


Art. 3º - O planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde.

Parágrafo único - As instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde, em
todos os seus níveis, na prestação das ações previstas no caput,obrigam-se
a garantir, em toda a sua rede de serviços, no que respeita a atenção à
mulher, ao homem ou ao casal, programa de atenção integral à saúde, em
todos os seus ciclos vitais, que inclua,como atividades básicas,entre outras:

I - a assistência à concepção e contracepção;

II - o atendimento pré-natal;

III - a assistência ao parto, ao puerpério e ao neonato;

IV - o controle das doenças sexualmente transmissíveis;

V - o controle e prevenção do câncer cérvico-uterino, do câncer de
mama e do câncer de pênis.


Art. 4º - O planejamento familiar orienta-se por ações preventivas e educativas e pela garantia de acesso igualitário a informações, meios, métodos e técnicas disponíveis para a regulação da fecundidade.

Parágrafo único - O Sistema Único de Saúde promoverá o treinamento
de recursos humanos, com ênfase na capacitação do pessoal técnico,
visando a promoção de ações de atendimento à saúde reprodutiva.


Art. 5º - É dever do Estado, através do Sistema Único de Saúde, em associação, no que couber, às instâncias componentes do sistema educacional, promover condições e recursos informativos, educacionais, técnicos e científicos que assegurem o livre exercício do planejamento familiar.


Art. 6º - As ações de planejamento familiar serão exercidas pelas instituições públicas e privadas, filantrópicas ou não, nos termos desta Lei e das normas de funcionamento e mecanismos de fiscalização estabelecidos pelas instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde.


Parágrafo único - Compete à direção nacional do Sistema Único de
Saúde definir as normas gerais de planejamento familiar.


Art. 7º - É permitida a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros nas ações e pesquisas de planejamento familiar, desde que autorizada, fiscalizada e controlada pelo órgão de direção nacional do Sistema Único de Saúde.


Art. 8º - A realização de experiências com seres humanos no campo da regulação da fecundidade somente será permitida se previamente autorizada, fiscalizada e controlada pela direção nacional do Sistema Único de Saúde e atendidos os critérios estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde.


Art. 9º
- Para o exercício do direito ao planejamento familiar, serão oferecidos todos os métodos e técnicas de concepção e contracepção cientificamente aceitos e que não coloquem em risco a vida e a saúde das pessoas, garantida a liberdade de opção.


Parágrafo único. A prescrição a que se refere o caput só poderá ocorrer mediante avaliação e acompanhamento clínico e com informação sobre os seus riscos, vantagens, desvantagens e eficácia.


Art. 10 - Somente é permitida a esterilização voluntária nas seguintes situações: (Artigo vetado e mantido pelo Congresso Nacional - Mensagem nº 928, de 19.8.1997)

I - em homens e mulheres com capacidade civil plena e maiores de vinte
e cinco anos de idade ou, pelo menos, com dois filhos vivos, desde que
observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação da
vontade e o ato cirúrgico, período no qual será propiciado à pessoa
interessada acesso a serviço de regulação da fecundidade, incluindo
aconselhamento por equipe multidisciplinar, visando desencorajar a
esterilização precoce;

II - risco à vida ou à saúde da mulher ou do futuro concepto, testemunhado
em relatório escrito e assinado por dois médicos.

§ 1º É condição para que se realize a esterilização o registro de expressa
manifestação da vontade em documento escrito e firmado, após a informação
a respeito dos riscos da cirurgia, possíveis efeitos colaterais, dificuldades
de sua reversão e opções de contracepção reversíveis existentes.

§ 2º É vedada a esterilização cirúrgica em mulher durante os períodos de
parto ou aborto, exceto nos casos de comprovada necessidade, por
cesarianas sucessivas anteriores.

§ 3º Não será considerada a manifestação de vontade, na forma do § 1º,
expressa durante ocorrência de alterações na capacidade de discernimento
por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou
incapacidade mental temporária ou permanente.

§ 4º A esterilização cirúrgica como método contraceptivo somente será
executada através da laqueadura tubária, vasectomia ou de outro
método cientificamente aceito, sendo vedada através da histerectomia e
ooforectomia.

§ 5º Na vigência de sociedade conjugal, a esterilização depende do
consentimento expresso de ambos os cônjuges.

§ 6º A esterilização cirúrgica em pessoas absolutamente incapazes
somente poderá ocorrer mediante autorização judicial, regulamentada
na forma da Lei.


Art. 11 - Toda esterilização cirúrgica será objeto de notificação compulsória à direção do Sistema Único de Saúde. (Artigo vetado e mantido pelo
Congresso Nacional) Mensagem nº 928, de 19.8.1997


Art. 12 - É vedada a indução ou instigamento individual ou coletivo à prática da esterilização cirúrgica.


Art. 13 - É vedada a exigência de atestado de esterilização ou de teste de gravidez para quaisquer fins.


Art. 14
- Cabe à instância gestora do Sistema Único de Saúde, guardado o seu nível de competência e atribuições, cadastrar, fiscalizar e controlar as instituições e serviços que realizam ações e pesquisas na área do planejamento familiar.

Parágrafo único. Só podem ser autorizadas a realizar esterilização cirúrgica
as instituições que ofereçam todas as opções de meios e métodos
de contracepção reversíveis. (Parágrafo vetado e mantido pelo
Congresso Nacional) Mensagem nº 928, de 19.8.1997



CAPÍTULO II
DOS CRIMES E DAS PENALIDADES



Art. 15 - Realizar esterilização cirúrgica em desacordo com o estabelecido no art. 10 desta Lei. (Artigo vetado e mantido pelo Congresso Nacional) Mensagem nº 928, de 19.8.1997

Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa, se a prática não constitui
crime mais grave.

Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço se a esterilização for
praticada:

I - durante os períodos de parto ou aborto, salvo o disposto no inciso II
do art. 10 desta Lei.

II - com manifestação da vontade do esterilizado expressa durante a
ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência
de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental
temporária ou permanente;

III - através de histerectomia e ooforectomia;

IV - em pessoa absolutamente incapaz, sem autorização judicial;

V - através de cesária indicada para fim exclusivo de esterilização.


Art. 16 - Deixar o médico de notificar à autoridade sanitária as esterilizações cirúrgicas que realizar.

Pena - detenção, de seis meses a dois anos, e multa.


Art. 17 - Induzir ou instigar dolosamente a prática de esterilização cirúrgica.

Pena - reclusão, de um a dois anos.

Parágrafo único - Se o crime for cometido contra a coletividade, caracteriza-
se como genocídio, aplicando-se o disposto na Lei nº 2.889, de 1o
de outubro de 1956.


Art. 18 - Exigir atestado de esterilização para qualquer fim.

Pena - reclusão, de um a dois anos, e multa.


Art. 19 - Aplica-se aos gestores e responsáveis por instituições que permitam a prática de qualquer dos atos ilícitos previstos nesta Lei o disposto no caput e nos §§ 1º e 2º do art. 29 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal.


Art. 20 - As instituições a que se refere o artigo anterior sofrerão as seguintes sanções, sem prejuízo das aplicáveis aos agentes do ilícito, aos co-autores ou aos partícipes:

I - se particular a instituição:

a) de duzentos a trezentos e sessenta dias-multa e, se reincidente,
suspensão das atividades ou descredenciamento, sem direito a qualquer
indenização ou cobertura de gastos ou investimentos efetuados;

b) proibição de estabelecer contratos ou convênios com entidades
públicas e de se beneficiar de créditos oriundos de instituições governamentais
ou daquelas em que o Estado é acionista;

II - se pública a instituição, afastamento temporário ou definitivo dos
agentes do ilícito, dos gestores e responsáveis dos cargos ou funções
ocupados, sem prejuízo de outras penalidades.


Art. 21 - Os agentes do ilícito e, se for o caso, as instituições a que pertençam ficam obrigados a reparar os danos morais e materiais decorrentes de esterilização não autorizada na forma desta Lei, observados, nesse caso, o disposto nos arts. 159, 1.518 e 1.521 e seu parágrafo único do Código Civil, combinados com o art. 63 do Código de Processo Penal.



CAPÍTULO III
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS



Art. 22 - Aplica-se subsidiariamente a esta Lei o disposto no Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, e, em especial, nos seus arts. 29, caput, e §§ 1º e 2º; 43, caput e incisos I , II e III ; 44, caput e incisos I e II e III e parágrafo único; 45, caput e incisos I e II; 46, caput e parágrafo único; 47, caput e incisos I, II e III; 48, caput e parágrafo único; 49, caput e §§ 1º e 2º; 50, caput, § 1º e alíneas e § 2º; 51, caput e §§ 1º e 2º; 52; 56; 129, caput e § 1º, incisos I, II e III, § 2º, incisos I, III e IV e § 3º.


Art. 23 - O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de noventa dias, a contar da data de sua publicação.


Art. 24 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Art. 25 - Revogam-se as disposições em contrário.


Brasília, 12 de janeiro de 1996;
175º da Independência e 108º da República.


FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 15.1.1996