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Masculinidades sin machismo

Em artigo publicado no jornal norte-americano The New York Times em junho passado, a jornalista Katrin Bennhold afirmou que “o feminismo do futuro está se transformando em atrair os homens para o universo das mulheres – como pais envolvidos, parceiros iguais no lar e embaixadores da igualdade de gênero, do gabinete à sala da diretoria”. O texto serve como uma pequena síntese para os dias atuais, em que os homens assumem gradualmente papéis que, anos atrás, eram desempenhados majoritariamente pelas mulheres. Os anos 2000 também marcam novos entendimentos sobre a figura do homem e o surgimento de políticas públicas focadas nesse público. Antigos deveres femininos vão, lentamente, sendo repartidos com os homens sob a forma de direitos garantidos por lei. As controvérsias suscitadas, no entanto, indicam que os parâmetros e ações ainda estão em construção.

No Brasil, apesar da lentidão do processo que em países nórdicos caminha a passos largos, o envolvimento do homem em questões reprodutivas, domésticas e do cuidado infantil é uma realidade que, aos poucos e em meio a obstáculos resistentes, ganha terreno. No início de setembro, a realização do “6º Seminário Nacional Homens e Masculinidades: Práticas de intimidade e políticas públicas”, organizado pelo Instituto Papai em Pernambuco (nordeste do Brasil), abriu discussões sobre as novas perspectivas que envolvem os homens atualmente.

A problematização do machismo, bem como o pensamento crítico do modelo patriarcal, foram um dos principais objetivos do encontro, de acordo com o pesquisador Jorge Lyra, coordenador-geral do Instituto Papai. “Essas questões envolvem outras, como a homofobia e a violência contra a mulher”, afirma.

O Seminário teve como foco as temáticas Homens e políticas públicas em saúde e Paternidade e direitos reprodutivos, entre outras. Para Jorge Lyra, a licença paternidade é um tema que precisa ser mais discutido. Atualmente, os pais têm o direito à licença previsto pela Constituição de 1988, que continua sendo de cinco dias e, mesmo transcorridos 22 anos, não há lei que regulamente o assunto. “A regulamentação é fundamental. Porém, mais do que isso, é preciso enfatizar a questão da licença parental. Independente do sexo, estamos tratanto de um filho, seja o pai adotivo ou gay”, defende o coordenador do Instituto Papai, que participou da campanha <>. O tema, ele reconhece, ainda é pouco debatido. “A discussão sobre masculinidade é uma novidade, e não se sabe muito o que fazer”, lembra.

Outra temática presente nas discussões e que reflete as dificuldades que envolvem a participação dos homens nos processos de gestação e cuidado infantil foi a Lei do Acompanhante (nº 11.108), sancionada em 2005. A medida prevê que os serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) sejam obrigados a permitir a presença de um acompanhante junto à mulher durante o trabalho de pré-parto, parto e pós-parto imediato.

Em 2007, o Instituto Papai realizou <> que traduziu em números as barreiras que o direito ao acompanhante, sobretudo a figura paterna, enfrenta. Em oito maternidades públicas de Recife, constatou o trabalho, o acompanhante foi considerado importante. No entanto, as avós do recém-nascido ou amigas constituíram a maioria dos acompanhantes da parturiente. O período de pré-natal é indicativo do quadro de dificuldades que há pela frente: o número de gestantes que vão sozinhas às sessões é elevado.

Nas etapas que envolvem o parto, é possível vislumbrar com mais exatidão os obstáculos impostos ao cumprimento da lei. Na pesquisa, quatro maternidades permitiram apenas mulheres como acompanhante, duas não autorizaram a presença de homens ou mulheres uma admitiu ambos. Apenas uma maternidade recusou-se a responder às perguntas da pesquisa.

Para o coordenador do Instituto Papai, existem barreiras individuais, institucionais e culturais a travar o cumprimento da Lei do Acompanhante. “Os serviços de saúde não se preparam adequadamente para a presença de um acompanhante. Os motivos são vários: a própria resistência médica, institucionalizada, que enxerga o acompanhante como um controle externo ao exercício da profissão; a cultura machista enraizada que enxerga os homens como indivíduos que mais atrapalham do que ajudam na hora do parto; e a visão de que as questões reprodutivas são assunto exclusivo das mulheres”, afirma Jorge Lyra.

O direito negado ao acompanhante, sobretudo o pai, traz prejuízos para os três indivíduos nucleares daquela situação. Jorge Lyra enumera os benefícios -cientificamente comprovados – trazidos pela presença do acompanhante. O processo fisiológico do parto é positivamente impactado, reduzindo o período de internação e recuperação. A parturiente ganha confiança e, consequentemente, aumenta a sensação de bem-estar dela e do bebê. Há um maior controle sobre o serviço de saúde, com uma vigilância direta contra abusos e procedimento desnecessários. A presença do pai na situação do parto contribui para uma maior integração ao cuidado infantil, tornando as tarefas mais compartilhadas entre os parceiros e facilitando, inclusive, a inserção das mães no mercado de trabalho.

Os problemas em relação ao cumprimento da lei 11.108 envolvem ainda a cobrança indevida, em clínicas privadas, de uma taxa para que a parturiente possa ter alguém ao lado. “É uma lei que, embora tenha se tornado pública, ainda enfrenta problemas quanto à sua efetivação. É preciso que haja um processo maior de sensibilização de todas as partes envolvidas para que a lei possa ser plenamente cumprida. Infelizmente, o machismo ainda resiste: a visão da mulher cuidadora versus o homem ausente é comum. Isso torna necessário que o combate a essa visão seja contínuo. A comunicação e a divulgação da lei, bem como a exposição de seus benefícios, são essenciais para que se possa avançar ainda mais na implementação de políticas públicas nessa área”, enfatiza Jorge Lyra.

Pré-natal para as mulheres e check up para os homens

Segundo o coordenador do Instituto Papai, desde 1998, quando ocorreu a primeira edição do Seminário, “a condição masculina vem sendo discutida a partir das contribuições e lições aprendidas com o movimento de mulheres e feminista e do movimento gay e lésbico. Para poder pensar essa condição, temos que ter em mente que ela não é da natureza, não é biogenética. É uma construção social, cultural e política”.

Para Jorge Lyra, as políticas públicas devem focar a saúde do homem sem que, por outro lado, se restrinja a essa perspectiva. “A saúde seria uma porta de entrada para refletir a questão da masculinidade e seus significados. É preciso ressignificar o entendimento sobre o homem e não restringir-se à medicalização da masculinidade”, afirma.

Nessa linha crítica, ele questiona também a recente iniciativa da Política Nacional de Saúde do Homem que pretende estimular os pais a realizarem um check up no período em que a parceira estiver fazendo o pré-natal. “Precisamos ter cuidados para não pensarmos nas mulheres de forma utilitarista, ou seja, colocar mais essa responsabilidade nas mãos das mulheres, de fazer com que os homens se cuidem. Além disso, nota-se uma concepção heteronormativa, pois na história desses homens pode não haver uma mulher. E os casais gays e os pais solteiros? Como ficam nessa iniciativa?”, questiona, embora reconheça que, levando-se em conta a estrutura de saúde nacional focada no pré-natal e no Programa Saúde da Família (PSF), a medida tem méritos por não criar um serviço específico para os homens e, sim, maximizar uma estrutura, um fluxo na saúde já existente.

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