CLAM – ES

Marco histórico y social

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por meio da Comissão de Diversidade Sexual, finaliza em agosto o Estatuto da Diversidade Sexual. O texto prevê uma série de normas e princípios com o objetivo de ampliar e resguardar direitos que ainda não estão disponíveis ou que ainda se encontram incompletos para a população LGBT.

Maria Berenice Dias, advogada especializada em direito homoafetivo e presidente da Comissão de Diversidade Sexual da OAB, afirma em entrevista ao CLAM que a iniciativa do Estatuto representa mais do que uma ação da classe. As discussões sobre o texto têm envolvido movimentos sociais, o que, segundo ela, será fundamental no momento em que o projeto for levado ao Congresso Nacional.

Leia abaixo a entrevista.

É possível afirmar que o Estatuto da Diversidade Sexual equivale para a população LGBT o que o Estatuto da Criança e do Adolescente significa para as crianças e os adolescentes e o que o Estatuto do Idoso significa para a terceira idade?

Sim, o propósito é este. Mais do que um marco legal, o Estatuto da Diversidade surge como um marco histórico e social, tal como foram os Estatutos do Idoso e da Criança e do Adolescente. Isso demonstra também que a iniciativa é uma ação importante para o reconhecimento da população LGBT em toda a sua diversidade, em meio a um cenário de barreiras e interdição de direitos.

O Estatuto é um microssistema que dispõe de normas, princípios e dispositivos que ampliam e resguardam os direitos em vários âmbitos. Além disso, é um importante sinalizador para a elaboração de políticas públicas que têm o papel de modificar a realidade.

Como têm sido as discussões sobre o Estatuto dentro da OAB? Qual o caminho do Estatuto após a aprovação dentro da entidade?

A OAB criou, no primeiro semestre deste ano, uma Comissão da Diversidade Sexual, da qual sou presidente. Existem comissões também nos estados. A movimentação dos grupos tem sido intensa. O órgão possui também consultores, e todos estão colaborando para a elaboração do texto.

A participação dos movimentos sociais tem sido muito importante, pois significa que a discussão não está restrita à classe. Nesse sentido, o Estatuto ganha relevância e valor por considerar a participação popular. E isso é determinante, pois o Estatuto, que deve ser finalizado até 18 de agosto, será posteriormente levado ao Congresso. A OAB apresentará o texto como proposta popular, o que injeta legitimidade na ação.

Qual a perspectiva da senhora para o andamento do texto no Congresso?

Eu estou confiante. Uma vez no Congresso, o texto terá um relator e as discussões serão necessárias. Haverá audiências públicas. Conhecendo as possíveis barreiras contra o Estatuto, a OAB preparou também uma emenda constitucional com o intuito de contornar e rechaçar o argumento de que as disposições do texto ferem a Constituição brasileira.

A conjuntura é favorável, sobretudo em função do reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo aprovado recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ressalto que a iniciativa do Estatuto é de amplo espectro, não é apenas uma ação da OAB. É uma ação da sociedade, que confere um peso relevante na hora em que o texto for apresentado e discutido. O carimbo da OAB e a participação popular serão fundamentais. A vez da população LGBT é agora. Os direitos têm sido reconhecidos pelo Judiciário. A chancela e o reconhecimento do Legislativo não podem ser descartados.

Qual o alcance que tal Estatuto tem?

O Estatuto trata de diversas prerrogativas que ainda não estão ao alcance da população LGBT. Pelo texto, todos os direitos devem ser iguais e isso inclui o casamento, a adoção de crianças, o acesso incondicional à educação, à saúde, ao mercado de trabalho e à dignidade da pessoa LGBT diante de manifestações homofóbicas.

Sendo aprovado e chancelado pelo Congresso Nacional, o Estatuto da Diversidade Sexual ganha valor inclusive criminal, pois prevê a criminalização da homofobia, com previsão de agravante para crimes com essa motivação.

É importante ressaltar que o Estatuto avança sobre a histórica omissão em relação às travestis e aos indivíduos transexuais. Por isso, o texto busca ampliar e garantir o acesso pleno aos mecanismos que envolvem a redesignação corporal, o tratamento hormonal, o uso do nome social. Nesse último caso, existe a previsão de que esses indivíduos frequentem as dependências conforme o sexo social, e não o sexo do registro.

O Estatuto tem uma finalidade didática e transformadora. A sociedade aos poucos vai se acostumando a lidar com a temática LGBT, com a temática da diversidade.

A senhora destaca a importância do Judiciário, nos últimos anos, na ampliação dos direitos da população LGBT. Qual a sua avaliação sobre o papel do Legislativo e do Executivo?

O Congresso brasileiro tem se mostrado omisso. Já o Executivo tem feito a lição de casa, demonstrando preocupação com a interdição de direitos, com as dificuldades sociais e culturais que pesam sobre os indivíduos LGBT e com a elaboração de políticas que visem enfrentar as barreiras.

O Estatuto, transitando no Congresso, será relevante também pois vai provocar os agentes legislativos a debaterem essa temática. Dessa forma, esperamos que as discussões avancem e resultem em reconhecimento.

Dentro do Congresso, após o reconhecimento da união civil pelo STF, houve uma divisão entre aqueles que defendem o casamento e aqueles que defendem a criminalização da homofobia. A senhora acredita que essa dissonância de bandeiras venha a ter algum impacto na tramitação do Estatuto no Congresso?

Não, de forma alguma. Não vejo dissonância. O movimento é plural. Acredito que a própria variedade de tendências reflita o crescimento que a questão LGBT tem alcançado nos últimos anos. Não há dissonância ou divergências. Existem prioridades distintas que só vêm a somar para a causa. Penso que a tendência é avolumar. Mesmo que haja prioridades diferentes, o Estatuto surge para unificar todas as demandas e tem como meta abarcar todos os direitos que ainda não estão plenamente garantidos ao segmento LGBT.

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