Parte das comemorações pelo dia internacional da mulher, o lançamento do livro Mulheres negras do Brasil(Editoras Senac) significa para os organizadores da obra, Schuma Schumaher e Érico Vital Brazil, “um profundo mergulho em contundentes silêncios da historiografia brasileira”. À época das comemorações pelos 500 anos do Brasil, lembra Schuma, a idéia era fazer uma publicação que trouxesse à luz a participação das mulheres nos cinco séculos de história do país.
“Pensávamos em fazer um levantamento sobre o papel das mulheres em nossa história e dar visibilidade a essas contribuições. A primeira idéia foi fazer um dicionário que agrupasse biografias de mulheres de diferentes segmentos. Logo nos deparamos com as dificuldades em encontrar biografias ou quaisquer registros de mulheres negras. As informações disponíveis não batiam. Então decidimos que estava na hora de ir buscar essas referências e dar visibilidade a elas”, diz Schuma.
Depois de lançar, ainda em 2000, o Dicionário Mulheres do Brasil — de 1500 até a Atualidade, Schuma Schumaher e Érico Vital Brazil resolveram fazer um livro, não mais no formato de dicionário, mas que fizesse um relato histórico dos 500 anos das mulheres negras no Brasil. Assim foi concebida a obra, que começa na África, em 1450, e mostra como as mulheres negras foram arrastadas de suas pátrias e levadas para o novo mundo. Neste primeiro capítulo, o livro fala também da bula papal de 1454, documento no qual o papa Nicolau V autorizava a escravização de pagãos.
Os outros três capítulos trazem o leitor até os dias atuais, apresentando cerca de 950 reproduções selecionadas entre os mais de 10 mil documentos iconográficos pesquisados, incluindo pinturas a óleo, aquarelas, gravuras, desenhos e fotografias. Além dos dados pessoais que conseguiram reunir, os organizadores narram alguns fatos e processos sociais relativos às mulheres afro-descendentes, muitos deles ainda inéditos na historiografia.
Ao ler os capítulos Abolindo o império e República das mulheres, e ver o papel que as mulheres negras desempenhavam tanto no império quanto nos cem anos que se seguiram à proclamação da República, o leitor vai perceber o quanto elas avançaram em termos de direitos. “Houve avanço porque as mulheres negras atuaram com força e competência, até conseguirem reverter a posição de escravidão e de submissão”, afirma Schuma.
Uma das mais atuantes feministas no cenário nacional, Schuma lembra que houve um tempo em que o feminismo, que dizia “somos todas iguais”, não percebia as diferenças. “Fomos percebendo as especificidades e que não éramos todas iguais. Se o propósito era a busca de direitos iguais, então era necessário olhar as diferenças”, observa.
Atualmente, segundo ela, o feminismo já incorporou em sua agenda a questão da superação do racismo. “Não diria que, na prática, isso já aconteceu totalmente. A ausência de mulheres negras é tão naturalizada e incorporada neste cenário embranquecido, que elas ainda não protagonizam discussões importantes. Mas é claro que houve um grande avanço”, conclui.
Para a autora, este avanço fica bem claro no último capítulo do livro – Rasgando os panos – que apresenta as mulheres negras no mundo da política e sua participação no movimento negro nas últimas três décadas, na cultura (artesanato, dança e literatura) e nos esportes.
O livro estará disponível para compra em todas as livrarias a partir do dia 14 de março.
Schuma Schumaher é pedagoga, especialista em Orientação Educacional e Administração Escolar. Integra o Movimento Feminista desde 1978. Foi Secretária Executiva e Diretora de Articulação Política do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (1985-88). Atualmente é Coordenadora Executiva da Organização Não Governamental Feminista- REDEH – Rede de Desenvolvimento Humano. Em 2004 recebeu o prêmio de Mulher do Ano (Diploma Bertha Lutz) concedido pelo Senado Federal e foi uma das 52 mulheres brasileiras indicadas ao Prêmio Nobel da Paz, em 2005.