A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) lançou, na quarta-feira (11/03), o Curso Gênero e Diversidade na Escola, projeto que visa, através de aulas semipresenciais, formar 3 mil educadores/as da rede pública de ensino de 15 municípios do estado do Rio de Janeiro nas temáticas de gênero, sexualidade, diversidade sexual, gravidez na adolescência, igualdade étnico-racial e participação juvenil. Em 2006, o projeto foi realizado em seis municípios de diferentes regiões do país – Niterói e Nova Iguaçu (RJ), Salvador (BA), Maringá (PR), Porto Velho (RO) e Dourados (MS) -, em uma parceria do Centro Latino-americano em Sexualidade e Direitos Humanos (CLAM/IMS) – responsável pelo conteúdo do curso e treinamento dos professores – com o governo federal e o British Council. Agora, em 2009, além da UERJ, o curso será realizado por 21 universidades públicas em todo o país.
O lançamento contou com a presença do reitor da Universidade, professor Ricardo Vieiralves, do antropólogo Sérgio Carrara, professor do Instituto de Medicina Social (IMS) e coordenador do CLAM, da Secretária Estadual de Educação, Teresa Porto, da representante da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), Elisabete Pereira, e dos Secretários e Secretárias de Educação dos municípios onde o curso será ministrado, os quais assinaram os convênios de cooperação.
Sergio Carrara ressaltou que o grande mérito do projeto é mostrar como a arquitetura da desigualdade se constrói. “Não é incomum que as categorias usadas para ‘diminuir’ as mulheres sejam as mesmas usadas contra os negros, como dizer que são mais emotivas e menos capazes. É também comum ver um aluno dizer ‘Sou negro, mas não sou gay’ ou ’Sou gay, mas sou branco’”, assinalou o antropólogo.
Representando a ministra Nilcéia Freire, Elisabete Pereira falou sobre o papel das mulheres e as discriminações sofridas por estas na sociedade brasileira. “Nossa maior preocupação é em relação aos adultos que queremos para daqui a 15 anos e que estes não continuem reproduzindo as mazelas que vemos hoje, em nossa sociedade. Definitivamente não queremos que a violência contra a mulher e a discriminação étnico-racial e contra as pessoas LGBT continuem a fazer parte de nossa realidade. Queremos cidadãos que respeitem as diferenças e que olhem para o seu próximo e o reconheçam como igual”, afirmou.
Também para o reitor da UERJ, professor Ricardo Vieiralves, o curso é importante por criar uma nova perspectiva para o futuro. “Que o Brasil seja um dia um lugar onde a violência não se estabeleça e a discriminação e o preconceito cessem”, disse ele.
Mesmo estando ausente, a ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéia Freire, gravou um depoimento sobre o projeto. Clique aqui para ver o vídeo. (produzido pela Brasil Vídeo Comunicação)
As inscrições dos/as professores/as cursistas vão até o dia 15 de abril. Clique aqui para inscrever-se.
Caso um/a professor/a não consiga assistir a primeira aula presencial em seu município, ele/ela poderá assistir em outro município. A primeira aula aconteceu no dia 16 de março, em Niterói, e a última será no dia 12 de maio, em Duque de Caxias. Clique aqui para ver a relação dos municípios e locais das aulas.
Diversidade como valor
Pesquisa da UNESCO sobre juventude e sexualidade realizada com 16.422 estudantes, 3.099 professores e 4.532 pais de alunos de escolas públicas e privadas em 12 capitais brasileiras, em 2005, mostrou que um em cada quatro alunos não gostaria de ter um colega homossexual em sala de aula – 41% dos meninos afirmaram não tolerar colegas gays ou lésbicas. A homofobia também existe entre os pais. Em Fortaleza (CE), 48% mencionaram que não gostariam que seus filhos estudassem com homossexuais, em Porto Alegre (RS) este índice foi de 22%. Os dados da pesquisa mostraram também que 2,3% dos professores não gostariam de ter alunos homossexuais. A pesquisa mostrou também que a gravidez em adolescentes ainda é tabu no país – dos estudantes de 10 a 24 anos ouvidos, entre 2,2% e 4,7% afirmaram que não gostariam de ter como colegas de classe mães solteiras – e que muitas vezes os professores não apenas silenciam, mas colaboram ativamente na reprodução da discriminação.
“Na maioria dos casos, quando os professores se deparam com ‘problemas’ como um aluno homossexual ou uma aluna grávida – é assim que muitos vêem –, eles logo encaminham estes estudantes para o psicólogo da escola. O grande desafio é fazer os professores compreenderem que eles devem lidar com essas questões sim. Eles têm o compromisso de formar um cidadão, portanto devem se comprometer com esses temas”, analisa a antropóloga Fabíola Rohden (CLAM/IMS), coordenadora do curso.
“A idéia é sensibilizar esses professores em gênero, sexualidade e raça/etnia e ampliar sua compreensão sobre os processos de preconceito existentes na sociedade, como a homofobia, o racismo e o sexismo. Pretendemos ir além do paradigma da tolerância, mostrando como a escola pode desconstruir estereótipos e preconceitos. Para isso, nosso método é discutir como o preconceito tem feito pessoas sofrerem dentro da escola. O curso é um convite ao debate e à reflexão”, avalia Fabíola Rohden.
O curso foi aplicado no Chile em 2007, em parceria com o Centro de Estudos para o Desenvolvimento da Mulher, oferecido a alunos/as de Pedagogia da Universidade Arturo Prat. Este ano, além da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), 19 universidades vão aplicá-lo em diferentes regiões.
A educadora Bel Santos, coordenadora de conteúdo do curso, lembra que “ao mesmo tempo em que a escola recebe as mazelas da sociedade – como a violência, por exemplo – ela também é um espaço que tem o potencial para construir outro cenário. Os professores precisam entender que ter diversidade na escola não é um problema, e sim, um valor”, diz ela.
Para ela, não será apenas a inclusão das palavras gay, lésbica, negro e mulher nos livros didáticos que vai garantir a transversalidade de temas na escola. A educadora alerta para algo muito comum nas escolas. “Muitas vezes, perde-se o foco da discussão e a responsabilidade da agressão e da discriminação recai sobre o discriminado. Já ouvi por parte de alunos e professores que fulano não foi agredido por ser gay, mas sim por andar rebolando. O foco sai sobre a homofobia e recai sobre o comportamento do discriminado”, afirma.
Ela problematiza o fato de alguns professores não considerarem as brincadeiras como manifestações de agressão, naturalizando e banalizando expressões de preconceito. “Dizer para um aluno ‘não liga para isso’ é muito pouco para quem está sendo chamado de ‘mariquinhas'”, ressalta.
Na quarta-feira, 11 de março, o curso será oficialmente lançado no Rio de Janeiro, através de uma cerimônia na UERJ com a presença do reitor da universidade, prof. Ricardo Vieiralves, da Secretária de Educação do Estado, Teresa Porto, e as Secretárias de Educação dos municípios em que o curso será ministrado.
Além disso, serão lançadas as publicações “Os desafios da transversalidade em uma experiência de formação on-line: Curso Gênero e Diversidade na Escola”, organizado por Fabíola Rohden, Leila Araújo e Andreia Barreto, e “Gênero e Diversidade na Escola: formação de professores em gênero, sexualidade, orientação sexual e relações étnico-raciais”, organizado por Maria Elisabete Pereira, Fabíola Rohden, Maria Elisa Brandt, Leila Araújo, Graça Ohana, Andreia Barreto e Roberta Kacowicz.
<