Por Washington Castilhos
O Relatório Anual de Assassinatos de Homossexuais no Brasil, produzido desde 2001 pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), registrou 312 assassinatos de gays, travestis e lésbicas no Brasil em 2013, média de uma morte a cada 28 horas. Em 2011 e 2012 foram 266 e 338, respectivamente. O relatório explicita detalhes de crimes chocantes, como o do professor Emanuel Bernardo dos Santos, da cidade de Serra Redonda, no estado da Paraíba, que, depois de ser esfaqueado 106 vezes, teve o cabo do objeto do crime introduzido em seu ânus. E o de Eliwelton da Silva Lessa, de 22 anos, atropelado três vezes por uma van em cima de uma calçada em São Gonçalo, Rio de Janeiro. E o da travesti Thalia, morta com 20 tesouradas, além de ter o pênis cortado, em Guarulhos, São Paulo.
A denúncia destes assassinatos como "crimes homofóbicos" e a "cobrança" por justiça e punição aos assassinos são estratégias políticas adotadas pelo movimento LGBT e alguns setores do Estado, visando políticas e leis que coíbam esses tipos de violências. Cunhado pelo psicólogo clínico George Weinberg em 1972, o termo “homofobia” e seus derivados (transfobia, lesbofobia) tem sido usado para definir sentimentos negativos em relação à homossexualidade e para adjetivar gestos de agressão e discriminação contra homossexuais.
Tais atos são evocados, em discurso dos ativistas LGBT, para justificar a necessidade de políticas e programas de combate à homofobia e, no caso do Brasil, uma reforma jurídica: a luta visa a criminalização da homofobia, seja nos mesmos moldes da lei que criminaliza o racismo no país (Lei 7.716/1989, conhecida como Lei Caó), seja através da codificação do “crime de ódio”, o que está sendo negociado entre o Movimento e representantes do Poder Legislativo que se opuseram ao Projeto de Lei original.
A denúncia dos chamados "crimes homofóbicos" confronta o Movimento com atores políticos vistos por ele como antagonistas. Na arena política, ativistas acusam as autoridades estaduais e federais de não garantir "a segurança da comunidade LGBT". Esta relação fica clara nas falas das lideranças do GGB à época do lançamento do Relatório 2013, que declararam que "a falta de políticas públicas dirigidas às minorias sexuais mancha de sangue as mãos de nossas autoridades".
O fenômeno da homofobia e a luta contra a impunidade dos crimes motivados por ela condensam uma complexa e variável constelação de atores e questões. Neste texto, enquanto as negociações no campo legislativo não avançam, abordamos o crescente diálogo entre o movimento social, esferas do Estado engajadas com as pautas dos direitos de LGBT, familiares das vítimas, e os quadros policiais envolvidos na investigação dos crimes. Dessa interação surgem algumas chaves interpretativas sobre a dinâmica de tais crimes e os padrões de violência que orientam as investigações policiais e as ações do movimento. Surgem também iniciativas da própria Polícia Civil, planejadas para tratar exclusivamente da violência letal que atinge lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.
Toda violência contra homossexuais é homofóbica?
“Não se trata de homofobia, mas de vingança” – alegou, de antemão, o delegado de Polícia responsável pelas investigações do assassinato de Eliwelton, o rapaz de 22 anos, atropelado três vezes por uma van em cima de uma calçada em São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro. Ele estava em um ponto de ônibus acompanhado de dois amigos quando um homem passou e começou a lhe fazer gracejos. Irritado com a provocação, o rapaz o enfrentou verbalmente. Segundo a polícia, o homem teria se retirado da cena e voltado com uma barra de ferro. Saindo em desvantagem mais uma vez no enfrentamento corporal, o provocador retirou-se novamente. Retornando momentos depois dirigindo uma van, subiu com o veículo na calçada e passou por cima do rapaz três vezes.
Pelo fato de o assassino ter levado desvantagem na briga, e ter voltado para se vingar, o crime pareceu, a um primeiro olhar do delegado, um crime de vingança. “Mas imagino se o homem mexeria com o rapaz, fazendo-lhe gracejos, caso ele não tivesse percebido que o rapaz era gay. Imagino também se, num crime de pura vingança, o assassino teria passado com o carro repetidas vezes por sobre o corpo da vítima. Ele o atropelou três vezes em questão de segundos. Não há dúvidas de que se trata de um crime de ódio motivado pela homofobia”, observou Cláudio Nascimento, superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos da Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro, em reunião com o delegado na ocasião da reivindicação da morte do rapaz.
Após a reunião entre o delegado, o presidente do grupo ativista local e o superintendente, o que acabou constando no registro de ocorrência foi mesmo a homofobia como causa presumida. Desde junho de 2009, a ‘homofobia’ passou a ser incluída como motivação de um crime nos boletins de ocorrência das 132 delegacias do Estado do Rio de Janeiro, uma das ações do Programa Estadual Rio sem Homofobia, em parceria com a Polícia Civil. Em 2011, um levantamento feito a partir dos boletins de ocorrência registrados em delegacias deu conta de que, dos 92 municípios do Estado, 42% tiveram denúncias de casos de violência contra homossexuais.
O Estado do Rio de Janeiro acaba de dar início a outra iniciativa importante: prestes a ser publicada, uma Portaria da Polícia Civil cria um Núcleo de Investigação de Assassinatos Homofóbicos, a fim de apurar homicídios com conotação homofóbica ou cujo motivo presumido seja a homofobia. A atuação do Núcleo será circunscrita à região compreendida pela Divisão de Homicídios onde será instalado.
A iniciativa não é pioneira no Brasil, uma vez que no estado da Paraíba, no nordeste do país, existe a Delegacia Especializada em Crimes Homofóbicos, criada para responder aos altos índices de crimes homofóbicos naquele estado e às reivindicações do movimento LGBT local (em pouco mais de uma década, entre 1990 e 2011, a organização não-governamental Movimento do Espírito Lilás (MEL) registrou 128 mortes de homossexuais no estado, de acordo com relatório elaborado em parceria com a Comissão da Diversidade Sexual e Direito Homoafetivo da Ordem dos Advogados do Brasil – seccional Paraíba). Mas apesar do não ineditismo, a iniciativa da Polícia Civil do Rio de Janeiro lança à polícia fluminense um desafio: o de entender o que é homofobia e quando e como ela está operando.
“A homofobia não é um fenômeno auto-evidente”, destaca o antropólogo Horácio Sívori (CLAM/IMS/UERJ). “Captar e compreender quando e como ela está operando requer treinamento. Explicar a sua operação requer um exercício de reflexão”.
Estudos demonstram que a brutalidade, o excesso e o exagero são marcas que caracterizam os crimes homofóbicos. Em sua pesquisa de doutorado em Ciências Sociais no Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, intitulada "Trincheiras de violência: entrecruzamentos cortantes entre relações de classe, gênero, sexualidade e território", Roberto Efrem Filho (UFPB) destaca que a homofobia se relaciona intrinsecamente com as figuras do ‘excesso’ e do ‘inexplicável’. Segundo ele, os ‘motivos fúteis’ indicariam uma desproporção entre as ‘tintas do crime e a sua motivação – uma discussão, como no caso do atropelamento proposital no Rio de Janeiro, por exemplo.
“Essa brutalidade consubstancia, segundo o Movimento LGBT, a presença da homofobia – e, portanto, dos laços entre a sexualidade da vítima e o crime”, afirma o sociólogo, lembrando que, durante o acompanhamento etnográfico das atividades do Movimento LGBT na Paraíba e da realização de entrevistas com seus militantes, ouvia de seus entrevistados o seguinte questionamento: “Quem, senão um LGBT, morreria nessas condições?”.
A crueldade pode até se achar associada a outros crimes – no caso do atropelamento aqui tratado, não há dúvidas de que o componente da “vingança” estava presente quando o agressor voltou à cena do crime após a discussão, conforme interpretação do delegado, mas, de outra perspectiva, a brutalidade excessiva do crime demonstraria a presença da homofobia. A brutalidade excessiva seria uma característica do crime de ódio.
De acordo com Efrem Filho, balas posteriores ao primeiro tiro – algumas delas quando a vítima já está morta –, dezenas de perfurações e/ou exagero na quantidade de socos preenchem o “excesso”. Segundo o pesquisador, a injustificável quantidade de golpes, como no caso do professor morto com 106 facadas na Paraíba – sua localização no corpo da vítima: o ânus –, ou o incompreensível número de vezes que o assassino passou com a van por sobre o corpo do jovem gay na calçada, em São Gonçalo (RJ), diferencia os “crimes de ódio” de outros crimes, mesmo dos chamados de ‘passionais’.
Além disso, esse requinte de violência estaria relacionado com outro elemento do crime motivado por homofobia. É que, além da agressão a uma vítima individual, a violência constituiria uma mensagem para toda uma classe de pessoas: ela morreu por (ser) travesti; ele morreu por (ser) homossexual. Configura, assim, uma espécie de “limpeza social”.
Quem são as vítimas?
Se a motivação e modus operandi dos agressores, além de orientar as ações do movimento LGBT, passaram a orientar também as investigações policiais, outra característica tornou-se conhecida das autoridades policiais: a dos padrões de vulnerabilidade. Embora a violência letal contra lésbicas também faça parte de registros policiais e conste em levantamentos como o do Grupo Gay da Bahia, gays e travestis aparecem sempre como as vítimas letais mais freqüentes. Isso é corroborado pela literatura acadêmica a respeito do tema. Nos textos “As vítimas do desejo” (2004) e “Tá lá o corpo estendido no chão…” (2006), Sérgio Carrara e Adriana Vianna tratam, respectivamente, de ocorrências policiais e processos no judiciário por casos de homossexuais assassinados por rapazes com quem eles tiveram relacionamentos íntimos, e de travestis executadas em locais públicos, no Rio de Janeiro dos anos 1980. Eles reconstroem a série de supostos que orientam a reconstrução do caso para avaliar a culpabilidade do agressor. No caso das vítimas homossexuais quando sexualmente “passivos”, emerge o relato de uma suposta ‘debilidade moral’ da vítima, da qual o agressor, motivado pelo lucro, teria se aproveitado. Nos casos das travestis, parece ser a exposição e participação em outros ilegalismos, associados ao ambiente da prostituição, que as colocaria em muitos casos na cena do crime. Em ambos os padrões de vulnerabilização, o exercício da sexualidade encontra-se costurado à violência.
“O risco faz parte do ethos da população LGBT”, observa Roberto Efrem Filho em trabalho apresentado no 37º Encontro Anual da Anpocs. “O território sexualizado pelo qual as travestis que se prostituem perambulam é o mesmo território criminalizado pela circulação de mercadorias ilegais, espaço público sombrio, delinqüente, em que a sexualidade e o crime perfazem a rua e a própria noção de risco”, completa o sociólogo.
De acordo com o pesquisador, o mesmo acontece com os homens gays que percorrem as noites desses territórios em busca de sexo. “Muitos morrem na rua ao procurarem canais de exercício da sexualidade e fruição do prazer, talvez intercedidos pelo dinheiro ou trocas patrimoniais. Ambas as bichas e as travestis atravessam esses territórios conhecendo os perigos e os riscos que os constituem”, assinala Roberto Efrem, ressaltando, porém, que inúmeras dessas relações não são passíveis de enquadramento simples na díade comercial michê-cliente.
Celso Mazzieri, jornalista encontrado morto em Porto Feliz, interior do estado de São Paulo, foi assassinado por três adolescentes. Segundo as investigações, a vítima chegou a estabelecer uma relação mais ou menos estável com um dos rapazes, todos com idade entre 15 e 18 anos. Os três garotos o estrangularam ainda quando este dirigia seu automóvel (um deles – o “namorado” – ocupava o banco do carona, e os outros dois o banco de trás do veículo. De acordo com as investigações, enquanto estes o estrangulavam com uma corda por trás, o “namorado” puxava o freio de mão). Quando interrogados como suspeitos do crime, eles justificaram o assassinato pela equação dinheiro-sexo. Mazzieri, segundo contaram, teria combinado uma quantia como pagamento por um “programa” e depois teria mudado de ideia.
“Aciona-se a imagem do dinheiro na cena de violência para excluir a possibilidade do afeto, do envolvimento emocional e do desejo. A menção ao ganho patrimonial – o dinheiro não pago ou o bem roubado – justificaria a ausência de prazer e o recurso à violência”, assinala Efrem Filho em seu trabalho.
Assim como o de Mazzieri, outro caso recente de assassinato demonstra como as distinções entre “cliente” e “michê”, “namorado” e “garoto de programa”, “rua” e “espaço privado” parecem ser mais fluidas do que as aparências indicam. Em fevereiro, o cabeleireiro Waldemir Devillart foi assassinado em sua cama, no interior de seu apartamento em São Gonçalo, no Rio de Janeiro, por um rapaz com quem se relacionava há anos – em troca de pequenas ajudas financeiras – e a quem, entre amigos, se referia como seu “namorado”. O rapaz constava na lista de “amigos” de Devillart em uma rede social. Segundo as investigações policiais, ele teria passado a noite com a vítima, assistiram filmes, comeram pipoca e tiveram relações sexuais. Na manhã seguinte o rapaz assassinou Waldemir a socos, tomou banho e saiu pelo portão principal do condomínio. Sua saída foi gravada pelas câmeras do circuito interno, o que ajudou a polícia na sua identificação e captura. Foi o irmão de Waldemir quem encontrou seu corpo na tarde daquele sábado, uma vez que, com a mãe internada, ele estranhou a sua ausência no hospital.
Na delegacia, o acusado – preso quinze dias após o crime – também usou a chave dinheiro-sexo para justificar seu ato e defender-se, alegando ter matado o cabeleireiro por que este fazia serviços de agiotagem e o estava cobrando, com ameaças, um dinheiro que lhe devia; o que foi desmentido pelo irmão da vítima.
Embora o artifício de tentar desqualificar ou culpabilizar a vítima continue sendo acionado pelos acusados – estimulados muitas vezes por seus defensores –, atualmente os agentes policiais têm se mantido de modo geral relativamente insensíveis a tais argumentos. O delegado encarregado do caso do cabeleireiro sugeriu à família – encabeçada pelo irmão e pela cunhada – que três amigos próximos a ele fossem depor para provar que a vítima não era agiota. Além dos depoimentos dos amigos, outra prova anexada ao inquérito foi o extrato bancário do cabeleireiro, cuja conta encontrava-se no vermelho. Improvável para alguém que prestava serviços de agiotagem.
Sobre este caso, embora o delegado tenha identificado no fundo a operacionalização da homofobia, ele a associou ao latrocínio, roubo seguido de morte. Os crimes contra a propriedade ou “crimes de lucro” emergem nos autos dos inquéritos e processos judiciais analisados por Sergio Carrara e Adriana Vianna em 2004. “Os roubos ou furtos, que poderiam ter acontecido em incontáveis momentos, considerando que aquele que matou morava com aquele que morreu e dispunha de trânsito livre em sua residência, dão-se exatamente quando da morte”, assinala Roberto Efrem Filho.
Segundo o Relatório Anual de Assassinatos de Homossexuais no Brasil do Grupo Gay da Bahia, em 33% dos assassinatos de LGBT (em diversas modalidades, como latrocínio, execuções etc) ocorridos no Brasil em 2013 a polícia chegou à autoria. No Rio de Janeiro, segundo dado do Programa Rio sem Homofobia, esse número chega a 50% dos casos.
O crescente interesse da polícia na investigação dos casos pode ser entendido como resultado de uma maior reivindicação dessas mortes por parte do movimento que, ao cobrar das autoridades a solução dos crimes, somada à mobilização das famílias das vítimas nessa ‘cobrança por justiça’, acaba dando maior visibilidade social a cada assassinato e, consequentemente, à homofobia de uma maneira em geral. “A publicidade de muitos desses casos marca uma mudança significativa: já não passa despercebida para o público ou permanece inadvertida a conexão entre eles e o contexto de tratamento violento e discriminatório que os torna possíveis, e os discursos reacionários que os promovem”, assinala Horácio Sívori.
O envolvimento e a atuação das famílias das vítimas tem sido de fundamental importância. Um exemplo é o papel desempenhado pela mãe de Natália ‘la Pepa’ Gaitán na reivindicação do assassinato da filha, perpetrado pelo padrasto de sua namorada em 2010 em Córdoba, Argentina. A defesa do acusado acionou o argumento da legítima defesa, aludindo à imagem estereotipada da lésbica masculina como uma pessoa brutalizada e agressiva. Coube à mãe da vítima iniciar a mobilização. Foi ela também quem primeiro relacionou o crime com a discriminação sofrida pela filha por ser lésbica durante o processo de judicialização e politização do caso.
A certeza da impunidade
“A legitimidade da violência se deve, em grande medida, à certeza da impunidade. Na cabeça do agressor, ele pode caçoar ou matar um gay, uma lésbica ou uma travesti porque não vai acontecer nada. E até não muito tempo atrás, não acontecia nada mesmo. Não podíamos sequer entrar numa delegacia para cobrar justiça por que éramos mal atendidos”, relatou um ativista presente a uma reunião convocada pela Superintendência de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos do Estado do Rio de Janeiro para discutir a implantação do Núcleo de Investigação de Assassinatos Homofóbicos, em que participaram também policiais civis envolvidos na iniciativa.
Em sua pesquisa, Roberto Efrem Filho (UFPB) aponta ter ouvido de algumas lideranças do movimento LGBT, por mais de uma vez, que “toda violência contra homossexuais é homofóbica porque supõe a impunidade”. A denúncia da homofobia é relacionada à premência da busca por direitos fundamentais. Mas trata-se, sobre tudo, de reverter essa impunidade.
“Embora essa compreensão não seja uníssona entre os integrantes do movimento – também ouvi discordâncias acerca dela – ela evidencia a centralidade da ‘punição’ em determinadas estratégias políticas”, diz o pesquisador. “Um entrevistado me disse: ‘quando eu mato um LGBT, no meu imaginário, eu estou limpando a sociedade daqueles que têm um demônio no corpo. Eu estou fazendo um bem, tirando da sociedade um cancro’”. Segundo Efrem Filho, essas falas sobre os crimes movimentam reivindicações como a do “combate à impunidade”.
No livro O fazer e o desfazer dos direitos, a antropóloga Adriana Vianna (Museu Nacional/UFRJ) aponta que a utilização de termos como “buscar os direitos” ou “conhecer/não conhecer os direitos” fala-nos não somente do controle da legislação, mas desse aprendizado surgido das arriscadas e às vezes penosas interações com aqueles que ocupam de algum modo o lugar de “autoridades”.
A reivindicação das mortes ou de outros casos de violência, claro, não consiste em uma estratégia exclusiva do Movimento de lésbicas, gays, bissexuais, e travestis e transexuais. Movimentos de trabalhadores rurais, mulheres, negros e militantes de esquerda contra a ditadura reivindicam a memória e justiça para seus mortos. Eles inserem essa demanda em meio a conflitos políticos atuais, acusam responsabilidades e se movimentam politicamente. O movimento LGBT faz o mesmo em relação ao legislativo, tratando-o como aquele que “fica ali sentado”, que nada faz enquanto mais um gay é assassinado e mais uma lésbica, travesti ou transexual é assassinada no país. Para a militância LGBT o efeito simbólico de conseguir uma lei que tipifique a violência por preconceito sexual seria tirar o estado desse letargo e, portanto, tirar os crimes da impunidade.