CLAM – Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos

Novas transições

Organizado pela demógrafa Ana Amélia Camarano, coordenadora da área de pesquisa em população e família do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), o livro “Transição para a vida adulta ou vida adulta em transição?” trata da condição juvenil no Brasil contemporâneo, enfocando questões como as relações afetivas, sexualidade e reprodução, a instabilidade e precariedade na inserção no mercado de trabalho, e os impactos da violência urbana no cotidiano dos jovens brasileiros.


O livro foi lançado no dia 15 de dezembro, no Rio de Janeiro, e é o resultado de uma pesquisa realizada entre 2001 e 2006, que teve como base os censos demográficos de 1980 e de 2000 sobre jovens entre 15 e 29 anos. Pesquisadores como Felícia Reicher Madeira (Fundação SEADE), Maria Luiza Heilborn (CLAM/IMS/UERJ), Solange Kanso (IPEA), dentre outros, participam da coletânea. A proposta é analisar a juventude à luz do seu processo de transição para a vida adulta, buscando contextualizar o que é específico do jovem e o que é transversal a outras fases do ciclo da vida. “A primeira motivação foi estudar as crises do jovem, depois passamos a estudar a transição desse jovem para a vida adulta, levando em conta os movimentos da infância e do envelhecimento”, lembra Ana Amélia.


Segundo ela, está cada vez mais difícil dizer o que marca a entrada do jovem no mundo adulto. “O modelo tradicional de transição considera que a entrada no mundo adulto começa pela saída da escola e entrada no mercado de trabalho e termina com o nascimento do primeiro filho. Entre esses eventos, ocorre o casamento e a saída da casa dos pais. Hoje, os eventos não seguem mais essa seqüência. Os jovens entram no mercado de trabalho e continuam estudando, têm filhos fora do casamento, casam e continuam morando com os pais”, exemplifica a demógrafa.


Um dos capítulos é dedicado à inserção dos jovens no mercado de trabalho e aponta que, embora a situação tenha ficado mais difícil para todos os grupos etários, para os jovens o quadro se tornou mais complexo. A população estudada pela pesquisa representava, em 2000, 28,3% da população e 58,1% dos desempregados no país. Cerca de 40% dos jovens empregados ganhavam menos que o salário mínimo. “O mercado está mais exigente em termos de qualificação e experiência. Este último quesito é o que falta aos jovens”, destaca a pesquisadora.


De acordo com o estudo, os jovens representam 8 milhões de brasileiros que não trabalham e, portanto, não são economicamente ativos. Destes, 2 milhões são homens e a grande maioria são mulheres. O estudo então aponta que, se está difícil para os jovens ingressarem no mercado de trabalho, essa dificuldade se acentua ainda mais para as mulheres jovens. “Essa disparidade ocorre, em grande parte, pelo fato da transição das mulheres ocorrer via casamento e maternidade. A maior parte dessas jovens mulheres já são mães. Das jovens de 15 a 19 anos, 14,8% tinham tido filhos, e quase metade dessas mães morava na casa dos pais ou de parentes”, diz Ana Amélia.


Segundo ela, o fato de as jovens mulheres estarem começando a vida sexual mais cedo, deve-se ao contexto atual de maior permissividade dos pais e da sociedade. Mas, se por um lado, a experiência da maternidade tem sido antecipada, o período de escolaridade do jovem se prolongou. “As pessoas estão passando mais tempo na escola. Entre 1980 e 2000, a escolaridade média da população de 15 a 29 anos aumentou 1,2 anos”, relata.


Sobre o tema da maternidade e paternidade juvenil, Maria Luiza Heilborn e Cristiane S.Cabral são autoras do capítulo “Parentalidade juvenil: transição condensada para a vida adulta”, no qual discutem as repercussões da gravidez na adolescência nesse processo de transição.


Outro capítulo do livro, dedicado à análise sobre mortes e violência, mostra que a mortalidade por causas externas, especialmente homicídios, aumentou substancialmente entre os jovens, nos últimos 20 anos – 56,6% dos óbitos por homicídio no país são de jovens. “Isto levou a uma redução de três anos na esperança de vida da população masculina. Aproximadamente 4,5% dos homens de 15 anos não chegam aos 30, devido a essa causa de morte”, diz a pesquisadora. Embora a esperança de vida dos homens tenha diminuído em função do aumento da violência, Ana Amélia observa que a duração da vida se prolongou. “Entre 1980 e 2000, a esperança de vida ao nascer aumentou 8,4 anos”.


A pesquisadora observa, entretanto, que o processo de transição não é homogêneo, sendo bastante afetado pelas desigualdades existentes no país. O estudo mostra que as mulheres vivem nove anos a mais que os homens. Por sua vez, os homens nordestinos saem da escola mais cedo, com uma escolaridade mais baixa, e entram no mercado de trabalho de forma mais precária. O resultado mostra ainda que as mulheres negras têm filhos mais cedo que as brancas e se casam mais tarde.