CLAM – Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos

Dia Nacional da Visibilidade Trans

Em 2004, o dia 29 de janeiro foi escolhido como o Dia Nacional da Visibilidade Trans, “um marco histórico para simbolizar a luta pela cidadania e por igualdade de direitos”, diz Majorie Marchi, presidente da Astra-Rio (Associação de Travestis, Transexuais e Transgêneros do Rio de Janeiro), em entrevista exclusiva ao site do Clam.”


 


 


Por que o dia 29 de janeiro foi escolhido como Dia Nacional da Visibilidade Trans?


No dia 29 de janeiro de 2004, 27 ativistas trans adentraram o Congresso Nacional para o lançamento da campanha “Travesti e respeito”. Esta foi uma ação pioneira, tratando-se de travestis e transexuais. Acredito que este evento mostrou para o grande público o real poder de articulação do movimento social organizado. Foi também neste dia que fundamos a Associação de Travestis, Transexuais e Transgêneros do Rio de Janeiro (Astra Rio).


 


Por isso o dia 29 de janeiro será o marco histórico para simbolizar a luta por cidadania e igualdade de direitos desses segmentos altamente discriminados. 


 


Por que a visibilidade é importante?


No caso de travestis e transexuais, já temos visibilidade há anos, mas uma visibilidade negativa que somente degrada e reforça esteriótipos deturpados da nossa imagem.


 


Nossa busca hoje é pela visibilidade positiva que mostre nossas demandas e mazelas, mas que também nos mostre como seres humanos dignos, respeitáveis e produtivos como qualquer outro cidadão.


 


Já passou da hora de estarmos sempre associadas a doenças, prostituição, analfabetismo e imoralidade. Não buscamos aprovação de ninguém, mas exigimos que nossos direitos civis não sejam vetados por nossa identidade de gênero.


 


Como se promove esta visibilidade?


A visibilidade que pretendemos  promover acontece com a valorização da auto-estima e do autoconhecimento de cada trans associada. Em um segundo momento, realizando ações e atividades que criem canais de articulação com o poder público, com promoções de saúde que garantam o direito das pessoas dentro e fora deste segmento. Isso vai criar uma rede de pessoas engajadas, onde a visibilidade acontecerá mesmo que timidamente, pois temos consciência de que nem todos meios de comunicação se interessam divulgar ações de real relevância para esta comunidade.


 


 


Como se consegue a visibilidade quando a sociedade não quer ver travestis, transexuais e transgêneros?


Acredito que conseguiremos visibilidade promovendo ações que permitam trazer informações sérias e referências positivas de trans e de trabalhos elas realizam. Isso precisa chegar ao conhecimento maior número de pessoas possível. Aqui no Rio, no ano passado, saiu uma reportagem no jornal O Dia denunciando que pessoas portadoras do HIV estavam sendo expulsas de comunidades carentes.


 


Por causa disso foi criado e colocado em teste o projeto “De mãos dadas”, em que nós vamos nas comunidades e promovemos palestras e oficinas sobre violência, saúde sexual e cidadania; sempre ministradas por profissionais, mas inteiramente organizada pelas travestis.


 


Além de elas promoverem a prevenção e informação na comunidade, acabamos ganhando, como retorno, o respeito e o agradecimento daquela comunidade. Esta é uma oportunidade de reduzir ações de preconceito, que costumam vitimizar as trans no local, pois as pessoas da comunidade se transformam em agentes multiplicadores de combate ao preconceito.


 


O trabalho contra discriminação é árduo e bastante longo. 


 


Na pesquisa que realizamos durante a 9ª Parada do Orgulho GLBT de São Paulo, as trans apresentaram os menores índices em relação à escolaridade e os maiores índices de experiências de discriminação e violência. Como a visibilidade pode alterar dados como esses?


A questão da escolaridade, se não for a primeira, é uma das primeiras discriminações sofridas por uma trans, ao iniciar seu processo de entendimento e construção da sua verdadeira identidade. Assim que ela assume alguma identidade visual trans é banida do ambiente escolar ou é agredida moral e psicologicamente por alunos(as), professores(as) e funcionários(as).


 


Muitas das vezes agreções físicas passam a fazer parte do cotidiano escolar dessas trans, resultando obviamente em abandono dos estudos.


 


E quanto ao fato da vivência das situações de violência deve-se ao fato da questão da sobrevivência e a exposição que se submetem para obter seu sustento nas calçadas. Sem a  visibilidade não poderemos denunciar esta situação nem acionar os órgãos competentes para tentarmos reverter este quadro.


 


 


O que foi feito no dia 29 de janeiro no Brasil para a promoção da visibilidade das travestis, transexuais e transgêneros?


Houve várias ações para comemoração de 29 de Janeiro, em sua maioria relacionadas à prevenção a DST /AIDS, igualdade  de direitos e cidadania. Não fizemos uma programação específica para a data, ficando a realização das atividades a critério de cada grupo.


 


 


Como o Dia Nacional da Visibilidade Trans se insere na história do movimento trans no Brasil?


Acredito que já está inserido e tem grande relevância para a comunidade trans, pois marca um dia de vitória grandiosa no campo político nacional.


 


 


 Qual é a agenda atual de reivindicações do movimento trans?


A agenda de reivindicações pode variar um pouco de estado para estado, devido às especificidades locais e o entendimento de cada gestor, mas no Brasil as prioridades que ainda persistem são: inserção no ambiente escolar e mercado formal de trabalho, campanha em nível nacional contra as discriminações transfóbicas e o combate do preconceito, garantia da troca do nome de registro, garantia do direito a acompanhamento hormonal pelo SUS e cirurgia de readequação gratuita e de qualidade para casos de transexualismo, entre outras.


 


É difícil colocar 500 anos de exclusão dentro de uma agenda única.