CLAM – Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos

Chamada aberta para dossiê: “Políticas da reprodução: perspectivas latino-americanas”

Encontra-se aberta a chamada para envio de artigos para integrar o Dossiê “Políticas da reprodução: perspectivas latino-americanas”, que será publicado em abril de 2026, no número 58.1 da Revista Antropolítica, vinculada ao Programa de Pós-graduação em Antropologia, da Universidade Federal Fluminense (PPGA/UFF), organizado pelas pesquisadoras Camila Fernandes (UERJ, RJ), Laura Lowenkron (UERJ, RJ) e Marjorie Murray (UC-Chile).
Prazo de envio dos artigos: 07/06/2025.

Saiba mais sobre o dossiê*:

Partindo da premissa de que toda reprodução é política (Ginsburg; Rapp, 1995) e/ou toda política é reprodutiva (Briggs, 2017; Fonseca et al., 2021), o objetivo deste dossiê é promover um diálogo regional entre perspectivas latino-americanas sobre o tema. A reprodução é entendida aqui como um conceito polissêmico, que não se restringe apenas a um fenômeno culturalmente concebido como biológico, incluindo também a reprodução social e as práticas de cuidado, tensionando fronteiras entre proteção e controle, mercado e não mercado, âmbito profissional e doméstico, dominação e reciprocidade, técnicas e afetos, apego e repulsão, amor e ódio. A reprodução pode ser entendida ainda como o meio pelo qual as novas gerações são produzidas. Nesse sentido, frequentemente ela está situada no centro de disputas e processos políticos em torno do futuro de comunidades, nações ou povos (Fonseca et al., 2021). 

Assim, ao falar em “políticas da reprodução”, estamos convocando debates sobre imaginários de nação, família, desejo, controle e intervenção das práticas estatais, nas quais a sexualidade e fertilidade de grupos racializados e periféricos tem especial inflexão.  Vale destacar que “políticas da reprodução” é um conceito introduzido no debate antropológico nos anos 1990 (Ginsburg; Rapp. 1995) com o intuito de chamar atenção para o modo como a reprodução é estruturada por meio de forças sociais e relações de poder que atravessam e conectam “dinâmicas íntimas, políticas nacionais e lógicas econômicas globais” (Fonseca et al., 2021). Isso sem perder de vista a agência das pessoas, especialmente, mulheres em seus esforços cotidianos de moldar suas vidas reprodutivas, em meio a relações de poder e constrangimentos diversos.  

A partir de um olhar focado nas políticas da reprodução na América Latina, Lynn Morgan e Elisabeth Roberts (2012) cunharam o conceito de “governança reprodutiva”, retomado recentemente por Claudia Fonseca et al (2021). Esse conceito serve para chamar atenção que políticas reprodutivas são engendradas a partir da ação de diferentes atores sociais e articulam diversas formas de governamentalidade. Além disso, a expressão “governança reprodutiva” é entendida como uma ferramenta analítica para traçar mudanças históricas e especificidades regionais dos regimes morais e racionalidades políticas em relação à reprodução. 

Se o final do século XX foi marcado pelo deslocamento de uma governança reprodutiva centrada no controle populacional para uma gramática dos direitos sexuais reprodutivos, é importante destacar que esse movimento se deu em um contexto de avanço de políticas de austeridade e do neoliberalismo, que levaram a retrocessos em suportes sociais e serviços de saúde (Morgan; Roberts, 2012). Logo, a ênfase nos direitos reprodutivos centrada na escolha ou autonomia individual tem sido frequentemente ancorada no mercado que reforça regimes de “reprodução estratificada” (Collen, 1995) e “hierarquias reprodutivas” (Diniz; Mattar, 2012) baseadas em desigualdades de classe, raça, etnicidade, gênero e localização em uma geopolítica global.

No contextual atual, marcado pelo aprofundamento de desigualdades sociais e ofensivas contra ou apropriações conservadoras da linguagem dos direitos reprodutivos, faz-se necessário pensar no leque de agentes implicados nas múltiplas relações de cuidado e violações de direitos reprodutivos. Nesse sentido, algumas questões podem ser levantadas: quem tem direito aos direitos reprodutivos? Ou quem se constitui efetivamente como um “sujeito de direitos” frente aos direitos reprodutivos? Quem pode desejar os direitos reprodutivos? E em que termos esses direitos são forjados ou reivindicados em diferentes contextos e por diferentes atores? Ou, ainda, que sujeitos de direitos têm sido produzidos por meio das formas de governaça ancoradas na linguagem dos direitos reprodutivos? 

A partir de pesquisas etnográficas realizadas em diferentes regiões do Brasil e/ou em países da América Latina, o dossiê pretende reunir trabalhos que ajudem a iluminar, a partir de recortes empíricos e contextos diversos, algumas dessas questões. Esta proposta é um desdobramento da organização do seminário “Políticas da reprodução: perspectivas latino-americanas”, realizado em 20 de setembro de 2022, no Instituo de Medicina Social da UERJ, que reuniu pesquisadoras do Brasil, Argentina e Chile.

Referências:

BRIGGS, L. How all politics became reproductive politics: from welfare reform to foreclosure to Trump. Berkeley: University of California Press.

COLEN, S. “Like a mother to them”: stratified reproduction and West Indian childcare workers and employers in New York. In: GINSBURG, F. D.; RAPP, R. (ed.). Conceiving the New World Order: the global politics of reproduction. Berkeley: University of California Press, 1995. p. 78-102

FONSECA, Claudia; MARRE, Diana; RIFIOTIS, Fernanda. “Governança reprodutiva: um assunto de suma relevância política”. Horizontes Antropológicos [online]. 2021, v. 27, n. 61 [Acessado 10 Junho 2022] , pp. 7-46. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S0104-71832021000300001>. Epub 06 Dez 2021. ISSN 1806-9983.

GINSBURG, F.; RAPP, R. (ed.). Conceiving the New World Order: the global politics of reproduction. Berkeley: University of California Press, 1995. (introduction)

MATTAR, Laura Davis e Diniz, Carmen Simone Grilo. “Hierarquias reprodutivas: maternidade e desigualdades no exercício de direitos humanos pelas mulheres”. Interface – Comunicação, Saúde, Educação [online]. 2012, v. 16, n. 40 [Acessado 10 Junho 2022] , pp. 107-120. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S1414-32832012005000001>. Epub 06 Mar 2012. ISSN 1807-5762. https://doi.org/10.1590/S1414-32832012005000001

MORGAN, L. M.; ROBERTS, E. F. S. “Reproductive governance in Latin America”. Anthropology & Medicine, [s. l.], v. 19, n. 2, p. 241-254, 2012

Considerando os critérios de avaliação imposto às revistas científicas, poderão ser selecionados 50% artigos de doutorandos, os demais artigos devem ter autoria de, ao menos, um doutor. Todos os artigos submetidos serão submetidos à avaliação às cegas de pareceristas externos, atendendo à política da revista. Para dar conta da diversidade de abordagens teóricas e metodológicas dos diferentes campos empíricos e problemáticas a serem debatidos, serão aceitos, preferencialmente, artigos das áreas de Antropologia e Ciências Sociais, observados os parâmetros de exogenia em relação à UFF.

OBS: Como há mais de uma chamada aberta para artigos em dossiês, faz-se obrigatório indicar no campo ‘Comentários aos editores’ que a submissão é para o Dossiê “Políticas da reprodução”.

As contribuições podem ser enviadas até 07 de junho de 2025 pelo sistema eletrônico da revista.

*Texto originalmente publicado na página on-line da Revista Antropolítica

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