Resultados da pesquisa “Diversidade Sexual e Homofobia no Brasil: intolerância e respeito às diferenças sexuais”, realizada pela Fundação Perseu Abramo em pareceria com a Fundação Rosa Luxemburgo Stiftung, mostra que um em cada quatro brasileiros tem preconceito contra pessoas LGBT. O estudo, cujo campo foi feito entre os dias 07 e 22 de junho de 2008 em 150 municípios brasileiros, distribuídos nas cinco macro-regiões do país, buscou captar as percepções da população sobre temas como preconceito e homofobia em relação a gays, lésbicas, travestis e transgêneros.
Foram feitas 2014 entrevistas domiciliares, com aplicação de questionários estruturados, somando 92 perguntas. A primeira delas buscou medir o grau de aversão ou intolerância a diversos grupos sociais, como gente que não acredita em Deus (42%), usuários de drogas (41%), garotos de programa (26%), transexuais (24%), travestis (22%), fanáticos religiosos (22%), ex-presidiários (21%), gente muito rica (20%), lésbicas (20%), gays (19%), pessoas com Aids (9%), judeus (11%), muçulmanos (10%) e índios (2%), entre outros.
“A partir daí entramos diretamente no tema do preconceito contra LGBTs”, relatou o sociólogo Gustavo Venturi, professor de Sociologia da USP e coordenador do estudo, durante lançamento da pesquisa na Academia de Polícia do Rio de Janeiro (ACADEPOL), no dia 15 de maio. Foram, então, feitas conhecidas afirmações preconceituosas para se medir o grau de concordância ou discordância dos entrevistados: destes, 84% concordaram totalmente com a frase “Deus fez o homem e a mulher com sexos diferentes para que cumpram seu papel e tenham filhos”, 58% com “A homossexualidade é um pecado contra as leis de Deus”, 38% com “Casais de gays ou de lésbicas não deveriam criar filhos”, 29% com “Quase sempre os homossexuais são promíscuos”, 29% com “A homossexualidade é uma doença que precisa ser tratada”, 26% com “A homossexualidade é safadeza e falta de caráter”, 23% com “Mulher que vira lésbica é porque não conheceu um homem de verdade” e 21% com “Os gays são os principais culpados pelo fato da Aids estar se espalhando pelo mundo” (neste último, embora 21% das pessoas entrevistadas tenham concordado plenamente, outros 12% concordaram em parte, o que alcança um índice de concordância de 33%. Há também um aumento em relação às outras perguntas se levado em conta os que afirmaram “concordar em parte”).
A pesquisa mediu ainda o grau de tolerância para a convivência com gays e lésbicas nas relações de trabalho e vizinhança, nas relações pessoais, com médicos e com professores. Ao medir o grau de tolerância entre os pais, 72% afirmaram que não gostariam de ter um filho gay, mas procurariam aceitar, enquanto 7% afirmaram que o expulsariam de casa.
O estudo enfocou ainda o preconceito assumido versus o chamado preconceito velado. Embora entre 69% e 72% das pessoas entrevistadas tenham afirmado não ter preconceito contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais, 26% admitiram preconceito contra o primeiro grupo, 27% contra o segundo e o terceiro e 29% contra os dois últimos. O estudo chegou a um índice de homofobia de 25% na população brasileira entrevistada.
“O problema é que no Brasil as pessoas se sentem mais à vontade para assumir seu preconceito contra os LGBTs do que contra outras populações, tidas como minorias. Em uma pesquisa que fizemos em 2003, apenas 4% dos entrevistados assumiram ser racistas. Isso quer dizer que o preconceito contra os LGBTs é maior do que contra os negros? Não necessariamente”, explicou Venturi.
Ao medir o índice de homofobia por sexo (um para cada 3 homens e uma para cada 5 mulheres), o estudo dá conta de que os homens são mais homofóbicos do que as mulheres.
Entre os LGBTs, foi perguntado como estes se sentem em relação a sua identidade sexual: 65% afirmaram se sentir à vontade, 26% orgulhosos. Perguntados se alguma vez já sofreram discriminação, 22% afirmaram já terem sido discriminados pelos pais, 27% na escola, 31% na família, 24% por amigos, 11% por policiais na rua, 9% por policiais na delegacia e 7% por professores.
“Mais da metade já sofreram um contexto de discriminação institucional, o que mostra que não se trata de relações interpessoais”, assinalou o sociólogo. “A qualificação da polícia e de educadores é a principal demanda da população”.
Presente ao evento, o ativista Cláudio Nascimento, a frente da Superintendência de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos, órgão do governo do Estado do Rio de Janeiro que trata de questões ligadas aos direitos LGBT, o problema não é assumir que tem preconceito contra esta população. “Mas temos que levar em conta que milhões de pessoas também assumem a possibilidade de rejeitar os homossexuais, inclusive através da violência física. Então, o problema não é não gostar, mas sim, não gostar e por isso querer exterminar”, disse ele.
Para o antropólogo Sergio Carrara (IMS/CLAM), debatedor da mesa, a pesquisa pode ser lida como uma espécie de termômetro de como as cosias estão acontecendo no Brasil atual. “Os dados revelam a presença forte da homofobia, mas também revela uma sociedade mais tolerante. Podemos olhar esses dados com um pouco mais de otimismo”, analisou Carrara.
“Alguns dados sugerem que estamos melhorando, como quando perguntamos às pessoas se a situação está melhor ou pior nos últimos vinte anos. A grande maioria afirmou que sim. Há uma maior visibilidade das pessoas LGBTs e por tudo isso acredito que estamos avançando em uma direção positiva”, finalizou Gustavo Venturi.