CLAM – Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos

Os limites da liberdade

O objetivo do debate “Liberdade e mercantilização do corpo” foi refletir sobre o posicionamento do feminismo, enquanto pensamento crítico, a respeito desta temática, preservando de um lado os direitos individuais e enfrentando por outro lado a complexidade de um problema social. A idéia era aprofundar a reflexão feminista sobre as controvérsias que envolvem o tema, analisando-o sob dois aspectos: o prisma do exercício da liberdade e a configuração de um problema ético-político.



O tema foi dividido em duas discussões: “Liberdade e prostituição” e “Liberdade e biotecnologias”, temáticas que, seja pela venda de sexo ou venda de embriões, levam ao questionamento sobre os limites da liberdade individual e da mercantilização do corpo.



O debate foi uma iniciativa conjunta do Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos (CLAM) com a Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB).





Liberdade e prostituição



Elisiane Pasini (Doutora em ciências sociais pela Unicamp)



Em sua comunicação, a pesquisadora refletiu sobre algumas questões relativas à prostituição feminina e a liberdade do uso do seu corpo, baseando-se em estudos antropológicos realizados em diferentes zonas de prostituição feminina, como a Rua Augusta em São Paulo e, mais especificamente, a Vila Mimosa, localizada nos arredores do centro do Rio de Janeiro.



“A prostituta vende seu corpo?”, questionou ela, apresentando, em seguida, elementos para refletir se a atividade da prostituição pode ser considerada uma profissão. Elisiane trouxe à tona um debate atual, o qual trata de propostas de legalização da prostituição no Brasil. “Através dessa pesquisa percebi, do ponto de vista dessas mulheres, sua capacidade de atuar e de tomar decisões”, concluiu.



Veja a íntegra da comunicação da pesquisadora.

 



Sílvia Camurça (AMB/SOS Corpo)



A feminista ampliou a discussão sobre mercantilização do corpo, não se restringindo à prostituição. Sua intenção foi mostrar o sexismo como economia política do sexo e questionar a naturalização e a banalização do corpo feminino através da imagem da mulher-objeto. “Somos mulheres, não mercadorias. Ao participar de um comercial, a mulher agrega valor àquele determinado produto. Este é um dos mecanismos de mercantilização da imagem do corpo das mulheres”, ressaltou ela, apresentando formas pelas quais a mercantilização se expressa – a propaganda, a prostituição, a pornografia, o turismo e o tráfico sexual. “Todas são organizadas e lideradas por homens. Embora as mulheres possam estar felizes em alguma dessas atividades ou sujeitas a elas devido à baixo auto-estima, situação de pobreza ou falta de oportunidades, ainda assim a dominação existe”, concluiu.





Liberdade e biotecnologias



Martha Ramírez (CEBRAP/Pagu-Unicamp)



A pesquisadora falou sobre as novas tecnologias reprodutivas e as repercussões individuais e sociais destes procedimentos no campo da saúde. “Essas tecnologias, que envolvem também os métodos contraceptivos, permitiram separar sexo de reprodução, dando às mulheres o direito a fazer escolhas. O sexo sem reprodução permitiu essa liberdade de escolha, mas a inversão desses conceitos – reprodução sem sexo – não. A questão não passa somente pelos direitos sexuais e reprodutivos. Será que essas tecnologias não estão nos dizendo Olha, você tem que ter um filho?”.



Segundo Martha, nesta perspectiva tudo pode virar mercadoria. “A inseminação artificial, por exemplo, abre para uma série de questões: a venda de embriões, a barriga de aluguel etc. Uma série de protagonistas que detêm o poder aparecem: a indústria farmacêutica, a rede de clínicas, a mídia. Isto nos permite desenvolver um raciocínio crítico em relação a essa questão, que na verdade vai além do fato de ter um filho. Ela acontece na esfera individual, mas pode trazer conseqüências que atingem o coletivo.”



Veja a íntegra da comunicação da pesquisadora.





Lílian Krakowski Chazan (Doutora em Saúde Coletiva pelo IMS/UERJ)



A expositora anterior centrou sua discussão na liberdade sobre a decisão de engravidar ou não, enquanto Lílian abordou a liberdade de manter a gravidez. A pesquisadora analisou a contradição entre o “apego” (da mulher pelo feto) reforçado pela imagem projetada pela ultra-sonografia e a liberdade da mulher de abortar, quando há diagnóstico de anormalidade fetal. “A ultra-sonografia valoriza a gravidez, deixando em segundo plano a discussão sobre a livre escolha”, observou Lilian.



“Aqui no Brasil, a ultra-sonografia virou um show. Procurei entender porque isso se organizou dessa maneira e como uma tecnologia médica virou outra coisa, permitindo o estabelecimento de um vínculo afetivo antecipado entre mãe-filho”, disse ela.

Veja a íntegra da comunicação da pesquisadora.



Veja as imagens do trabalho cedidas pela pesquisadora.